Bolsa família: uma obra para a história

domingo, 24 de janeiro de 2010

Do Último Segundo – Luís Nassif
Coluna Econômica – 21/01/2010
Prestes a deixar o cargo – para ser candidato a candidato ao governo de Minas Gerais pelo PT – o Ministro do Desenvolvimento Social Patrus Ananias deixa em seu currículo a montagem do mais bem sucedido programa social do país – depois do SUS (Sistema Único de Saúde) -, o Bolsa Família, considerado o mais bem sucedido programa de massificação de políticas sociais já tentado no mundo.
Levará algum tempo para se produzir a obra definitiva sobre o programa, os desafios iniciais, a consolidação do corpo técnico, a montagem das redes com movimentos sociais, prefeituras, demais ministérios, para o feito de levar políticas compensatórias a 50 milhões de pessoas, 12 milhões de famílias, um quarto da população brasileira.
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Antes do Bolsa, os teóricos de políticas sociais se dividiam em duas linhas. De um lado os focalistas, especialistas em indicadores e estatísticas que centravam seus estudos na identificação dos segmentos mais necessitados da população. De outro lado, os universalistas, defensores das políticas sociais universais.Havia uma dissonância invencível entre eles. As técnicas estatísticas são fundamentais para se conseguir otimizar a aplicação dos recursos. Mas o discurso focalista era utilizado para impedir a ampliação dos gastos sociais.
Por outro lado, os universalistas, embora mais generosos na distribuição de recursos, tendiam a considerar que qualquer forma de controle e acompanhamento prejudicaria os objetivos finais dos programas sociais.
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Oriundo dos movimentos sociais, mas com uma passagem executiva como prefeito de Belo Horizonte, Patrus soube juntar o que de melhor havia nas duas linhas.
Dos focalistas trouxe o maior nome – o técnico do IPEA (Instituto de Pesquisas Econômico Aplicadas) Ricardo Paes de Barros, referência internacional – e as técnicas para hierarquizar a pobreza, permitindo chegar de forma mais eficiente nos segmentos de miséria absoluta. Dos universalistas, trouxe a convicção de que políticas sociais têm que ser universais – mas sem abdicar da ciência dos indicadores e acompanhamentos.
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O passo seguinte foi definir as prioridades dos programas sociais. O MDS toca vários programas, do Bolsa Família aos Benefícios Continuados (como aposentadoria para idosos). Mas o desafio maior, o ponto inicial de qualquer política social, é o atendimento da mais básica das necessidades, a fome. Esse foi o foco, que fez com que o programa substituísse seu antecessor, o desastrado Fome Zero.
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O desafio seguinte era montar a rede de parceiros, para garantir a estrutura mais enxuta possível na sede. O programa é tocado por 1.500 pessoas, estrutura mínima para a população atendida.
Na ponta recorreu-se aos movimentos sociais e, especialmente, às prefeituras – incumbidas de cadastrar os beneficiários. Para prevenir fraudes, foram montados convênios com Ministérios Públicos Federal e Estaduais, visando a criminalização das fraudes. Depois, tratou-se de fortalecer os conselhos municipais e regionais.
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Ainda há um longo caminho pela frente. Mas caminha-se para a constituição de uma rede social, um processo em construção, que tornará o programa irreversível.

VALOR ECONÔMICO (SP) • POLÍTICA • 21/1/2010 Balanço social de pouco brilho

César FelícioEntre os muitos roteiros sonhados pela ala serrista do PSDB para convencer o governador de Minas, Aécio Neves, a aceitar a vaga de vice na chapa de José Serra (atual governador de São Paulo) à Presidência está a carta social: seria oferecido a Aécio um ministério estratégico, como educação ou saúde, para que desta plataforma o mineiro saltasse para uma aventura presidencial no longínquo 2018, conforme descreveu no mês passado Caio Junqueira no Valor.É uma hipótese remota, mas que desperta a curiosidade sobre o que foi a gestão social dos oito anos de governo Aécio em Minas Gerais. Criador de um modelo nacional de gestão administrativa com resultados financeiros surpreendentes, Aécio teve um desempenho discreto em relação ao que a marquetagem chama de "cuidar de gente". A focalização e um certo conservadorismo nas ações marcaram sua administração. Aqui se tratará de segurança pública, educação e Desenvolvimento Social.Aécio conseguiu diminuir a violência urbana em Minas Gerais, mas de maneira bem menos acentuada do que foi feito em São Paulo. Entre 1990 e 2002, o desemprego na região metropolitana de Belo Horizonte dobrou de 10% para 20% o que colaborou para que, ao assumir o governo, em 2003, Aécio administrasse uma crise na segurança pública, com a violência subindo exponencialmente. O governador procurou integrar as polícias civil e militar e lançou mão até de uma parceria pública-privada (PPP) para ampliar vagas no sistema prisional. No único indicador de segurança pública que permite comparação entre diversos locais e análise em séries longas de tempo - o índice de homicídios dolosos por grupo de 100 mil habitantes - a reação foi discreta. Em 2008, o índice ficou em 30,9 na capital mineira. Era de 36,8 em 2002, tendo atingido um pico de 52,8 em 2004 e recuado desde então. A população carcerária em estabelecimentos prisionais passou de 5,6 mil para 30,2 mil entre 2003 e 2008, mas no ano retrasado ainda havia 15,8 mil presos em delegacias da Polícia Civil.Na educação, Aécio teve como seu maior problema demonstrar com resultados o acerto de seu governo. A grande aposta da gestão Aécio foi a criação de uma rede de escolas referência, com tratamento privilegiado na distribuição de recursos. A rede começou em 2004 com 223 escolas selecionadas por meio de um processo competitivo. Em 2007, 713 escolas já eram referência. "É uma visão antiga de focalização, uma vez que cria ilhas de excelência. Não faz sentido o poder público fomentar uma estrutura elitizada de educação", afirmou um conhecido crítico do governo mineiro na área, o sociólogo Rudá Ricci, do Instituto Cultiva. Ricci concede um ponto favorável a Aécio no setor: o Estado de fato foi o primeiro a garantir nove anos de ensino fundamental, uma política estabelecida nacionalmente, mas de adesão gradual. Em comparação a outros Estados, o desempenho de Aécio Neves na educação mostrou aspectos discutíveis. Minas Gerais foi o único entre os 26 Estados e o Distrito Federal em que a avaliação do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) nas séries iniciais do ensino fundamental não subiu entre 2005 e 2007. No ensino médio, a avaliação ficou estacionada em 3,8, enquanto subiu em 13 Estados. Nas séries finais do ensino fundamental, a avaliação aumentou de 3,8 para 4. Levando-se em conta apenas as escolas da rede estadual, o panorama não muda muito: a nota nas séries iniciais do ensino fundamental ficou em 4,9 entre 2005 e 2007, enquanto subiu em todos os demais Estados das regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul. Como Minas, ficaram apenas Bahia, Pará, Roraima e Amapá. A secretária da Educação, Vanessa Guimarães, apresentou à época uma contestação por escrito, afirmando que os resultados apurados eram inconsistentes. Apontou, entre outros elementos, que o indicador elaborado pelo Ministério da Educação indicava melhorias em relação ao que ocorreu em Minas nos índices de Estados que passaram por cinco meses de greve na rede escolar. Ressalve-se que Minas teve a segunda maior avaliação do País nas séries iniciais. O que inexistiu foi evolução em relação ao levantamento anterior.Na área de Desenvolvimento Social, somente agora, em 2010, Aécio conseguiu dar escala a um de seus principais projetos, o programa Travessia, que direciona investimentos em saúde, saneamento, educação, infraestrutura e geração de renda nas áreas mais pobres do Estado. Ao ser lançado, em 2008, o programa beneficiou apenas cinco cidades. Este ano, em que Aécio será governador apenas até o fim de março, o Travessia deve atingir a marca de cem municípios, uma aplicação de R$ 345 milhões. Mais abrangente, o Programa de Combate à Pobreza Rural, com recursos do Banco Mundial, chegou a 188 municípios, mas os recursos aplicados são modestos: o programa estrutura-se em uma linha de crédito de US$ 70 milhões.Pulverizadas em várias iniciativas, a ação social está fadada a não imprimir uma marca no governo Aécio. Para a eleição de 2010, ele se apresentará com os bons resultados do "choque de gestão". E para a posteridade, talvez o governador seja lembrado pelo gigante de 100 mil m3 de concreto, 13 mil toneladas de aço, 10 mil m3 de vidro e 77 elevadores que construiu na periferia de Belo Horizonte. Esplendor da tecnocracia, a Cidade Administrativa de Aécio, que deve começar a operar possivelmente fevereiro, poderá ser a mais perfeita tradução de seu governo.César Felício é correspondente em Belo Horizonte. A titular da coluna, Maria Inês Nassif, está em fériasE-mail cesar.felicio@valor.com.br

1 comentários:

Marcelinho disse...

Caro Gléber,
não sou PSDBista, nem professo simpatia alguma por qualquer legenda, inclusive o PT.
Mas, fazer política em cima de políticas bem sucedidas de governos anteriores, ahhhh, isto não.
Como exemplo, a estabilidade econômica que vivemos no Brasil, hoje, é fruto inicial do Plano Real, lá dos idos de 1994, quando então, nosso Presidente era o Itamar Franco e seu Ministro Fernando Henrique e outros criaram o plano e a nova moeda, forte.
Também, revendo papeis, documentos, etc. (hoje com a internet as coisas ficam mais fáceis0, posto-lhe o link da fala de lula, em 2000 e em 2009.
Não podemos esquecer de nada.
Fiquei muito triste por você não ter ganho as eleições aqui em MG. Confesso-lhe que torci por você. sei de seu dinamismo, mas sem radicalismo (uma das marcas de alguns do PT).
http://www.youtube.com/watch?v=VRxGdrcnDlg
Abraços.